Estratégia singular

Marca Under Skin é apresentada ao mercado brasileiro, com um planejamento  que quebra paradigmas para a indústria farmacêutica nacional frente aos dermocosméticos



Por décadas, os laboratórios farmacêuticos julgaram serem eles os únicos fornecedores relevantes das drogarias brasileiras. Afinal, até a metade dos anos 1990, a farmácia era quase que exclusivamente dispensadora de medicamentos. Os poucos itens de higiene pessoal com algum espaço eram os básicos, como fraldas, absorventes, sabonetes e shampoos. O seu papel ali era basicamente o de conveniência.

Para nossa sorte, esse tempo ficou para trás. Ao longo dos últimos 20 anos, o varejo farmacêutico enfrentou uma mudança sem precedentes e que se acentuou incrivelmente desde o início desta década. Neste processo evolutivo, as categorias de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos deixaram de servir apenas como uma oferta de conveniência para esses pontos de venda, assumindo um papel central na construção da imagem, do mix, da capacidade de gerar tráfego para as lojas e, principalmente, da margem do varejista. E nenhuma categoria sentiu de maneira mais positiva os reflexos desse movimento do que a de dermocosméticos. Na verdade, a afirmação chega a ser injusta. Foram os dermocosméticos que ajudaram no entendimento do valor que o negócio de cosméticos poderia gerar para os varejistas.

Os laboratórios farmacêuticos tradicionais não ficaram necessariamente contentes com esse avanço, naturalmente por não serem parte dele. Como o discurso clássico para definir um dermocosmético é que são produtos que ficam no limiar entre um medicamento e um cosmético, boa parte deles, especialmente os laboratórios nacionais, passaram a se perguntar com cada vez mais frequência: por que não aproveitar esta oportunidade e ocupar esta fatia apetitosa do mercado? Afinal, eles têm o canal nas mãos, com uma capilaridade de distribuição incrível, relacionamento com os médicos, a logística e os recursos necessários para fazer acontecer.

Só que na prática, a realidade é um pouquinho mais complicada. Ainda que o modelo de negócios emule alguns elementos clássicos da indústria farmacêutica, especialmente a relação com os médicos – no caso aqui os dermatologistas – e o modelo de vendas muito baseado nas prescrições, construir um negócio na categoria de dermocosméticos é muito mais difícil de ser entendido por uma indústria farmacêutica do que por uma de cosméticos. Não é questão de qual indústria é melhor. São negócios simplesmente muito diferentes. E com o tempo, os próprios laboratórios acabam se dando conta disso. Muitos dos que resolveram apostar fichas na categoria, tão logo os executivos da empresa começam a se debruçar um pouco mais detalhadamente sobre as necessidades – peculiaridades e dinâmicas próprias do universo da beleza –, parece que a conta do investimento deixa de fazer sentido para eles, ao menos dentro daquele universo.
Por tudo isso, o lançamento da Under Skin é tão surpreendente e quebra paradigmas para a indústria farmacêutica nacional frente aos dermocosméticos.

Dando forma ao sonho
Leonardo Sanchez (foto), sócio do grupo NC e CEO da Under Skin, explica que o desejo de criar uma marca nacional de dermocosméticos é antigo e veio de sua mãe, a empresária Nanci Sanchez, que queria desenvolver uma linha à altura das estrangeiras. “Esse desejo se tornou um sonho. Entretanto, cerca de dez anos atrás, o grupo não estava preparado para dar esse passo, principalmente por estarmos focados na expansão na indústria farmacêutica”, lembra Leonardo.
Em 2010, Nanci faleceu, vítima de H1N1. Depois desse momento difícil e muito doloroso – quando Leonardo ficou “paralisado” por dois anos –, o empresário quis pôr em prática o desejo da mãe. “Eu vou transformar o sonho da minha mãe em realidade, aproveitando todo o know-how do grupo – de indústria farmacêutica –, e pesquisando o que falta no mercado.”

A nova empresa é um negócio independente, totalmente dedicado à beleza, em um grupo majoritariamente farmacêutico. O Grupo NC, sigla que para Nanci e Carlos Sanchez, fundadores do conglomerado, controla a EMS – maior indústria farmacêutica brasileira, além de outros laboratórios importantes como a Germed e a Legrand. Como todas as farmacêuticas, muito tempo e esforço foram dedicados para que o grupo pudesse entrar no segmento de dermocosméticos por meio de seus laboratórios. Isso até aconteceu no caso da Germed, com a marca Derms, uma linha muito bem resolvida, mas que não teve como objetivo trazer nada de novo ao mercado, mas sim complementar o portfólio da empresa.

Ao longo do processo, os controladores chegaram à conclusão de que para criar uma linha que fosse realmente diferenciada e agregasse algo novo ao já “congestionado” mercado de dermocosméticos, seria preciso deixar o mindset farmacêutico de lado e partir para uma empreitada totalmente independente. E é dessa premissa que nasceu a ideia de criar a Under Skin como um novo empreendimento do grupo. O negócio é fruto de um investimento de aproximadamente R$ 35 milhões aplicados em Pesquisa, Marketing, montagem da equipe e redesenho da planta industrial da Nature´s Plus, a fábrica de produtos de higiene pessoal e correlatos do Grupo NC e que está sendo incorporada à estrutura da Under Skin (mas continuará atendendo às outras empresas do grupo).

De acordo com o planejamento, a Under Skin terá quatro coleções U.SK Cleaning & Toning, U.SK Revitalizing, U.SK Anti-Aging e U.SK Protecting. A primeira chegou ao mercado em maio. Já as outras três têm previsão de lançamento para setembro deste ano.

Todo o peso a favor
O fato de nascer independente não quer dizer que a Under Skin não opere em sintonia e se valha do suporte de outras empresas do Grupo NC. Pelo contrário, a ideia foi se valer dessa premissa para desenvolver produtos com o mais alto padrão de tecnologia. Para desenvolver as formulações, por exemplo, Leonardo e sua equipe recorreram ao laboratório de pesquisa italiano Monte Research, fundada em 1997 e que atua, entre outras frentes, no desenvolvimento de sistemas de distribuição de drogas para otimizar o processo de absorção pelo organismo humano e na pesquisa de biomedicamentos e novas formas farmacêuticas. Em 2006, a EMS fechou um acordo de pesquisa com o laboratório para o desenvolvimento de medicamentos genéricos bioequivalentes e, posteriormente, acabou adquirindo o controle da operação, que hoje é uma unidade independente dentro do Grupo NC. “Eu convidei o Dr. Jean Carlos, chefe do centro de pesquisa da Monte Research, e lancei um desafio a ele: desenvolver formulações altamente tecnológicas e sofisticadas, juntamente com médicos dermatologistas italianos”, explica. Vencida essa fase, surgiu outra necessidade: criar um centro de pesquisa no Brasil, para “tropicalizar” a formulação dos produtos de acordo com as necessidades específicas da pele brasileira. Com esse processo, foi possível unir os diferentes conhecimentos e as tendências desses dois universos.

Para lançar a marca U.SK, foram necessários anos de estudos, pesquisas e testes. “Entramos nesse mercado com um grande diferencial que é trazer a ciência ao produto. O produto não é bom só porque eu acho isso, mas sim porque ele foi testado, amostrado, tem protocolos clínicos que comprovam sua eficácia”, comenta o empresário. Segundo Leonardo, o berço da inovação e tecnologia em produtos de beleza e saúde está nos Estados Unidos e na Europa. Sendo assim, é mais simples, rápido e menos burocrático criar os produtos (e as formulações) fora do País.

No Brasil, a área de P&D está sob a responsabilidade de Silvana Massiero. A experiência anterior da pesquisadora, que atuou por 19 anos na área de P&D da Johnson & Johnson liderando projetos regionais e globais, facilitou a ponte entre as duas culturas. Ela chegou ao grupo há três anos, quando foi contratada para montar um grupo de Pesquisa e Desenvolvimento para o grupo, e há uma ano e meio, foi convidada por Leonardo para o start-up do projeto de desenvolver uma marca premium de dermocosméticos. “Costumamos brincar que eu sou a primeira semente da Under Skin”, diz. Foi ela a responsável por direcionar o trabalho dos pesquisadores italianos, garantindo a viabilidade e a adequação dos produtos à nossa realidade. “Minhas experiência é de trabalhar com muitas culturas diferentes e você tem de respeitar a opinião de cada um, e ao mesmo tempo, deixar clara a sua posição. Se eu não tenho como viabilizar aqui uma ideia, nós precisamos achar outra alternativa. Normalmente o grupo técnico não tem vaidade. E no nosso caso, a Monte Research já entendia a nossa cultura porque a empresa já atua em parceria com o grupo há muito tempo”, revela Silvana.

A gerente explica que o principal desafio foi a nacionalização dos produtos para o Brasil. Não em relação às formulações, que precisaram apenas de um ajuste ou outro. Para viabilizá-las, alguns ativos, inclusive, estão sendo trazidos pela primeira vez ao Brasil, importados diretamente pelo Grupo NC. O grande desafio está nas embalagens e no processo de envase das linhas mais sofisticadas. “Lá (na Europa) eles lidam com uma tecnologia fabril diferente da nossa. Tudo é mais fácil”, pontua. Exceto pela coleção Cleaning & Toning (de limpeza), a primeira a ser lançada, cujo processo de produção é relativamente simples, os próximos lançamentos envolvem frascos com sistemas mais complexos, em função das formulações e investir em máquina e ferramental tem sido fundamental para viabilizar isso. E também uma grande dor de cabeça. As embalagens vêm de fora, principalmente da Coreia e da China. Segundo Silvana, a empresa não encontrou aqui no Brasil frascos com o nível de sofisticação que as fórmulas demandavam.

Chegando ao mercado
A linha Cleaning & Toning tem quatro itens: U.SK Cleanser (sabonete líquido), U.SK Scrub (esfoliante), U.SK Hydra CalmingToner (tônico de limpeza e hidratação facial para peles seca e normal) e U.SK Balance Toner (com efeito adstringente, é um tônico de limpeza e hidratação facial para pele mista e oleosa). As outras linhas serão lançadas no decorrer do segundo semestre. “O primeiro passo é a limpeza, profunda, mas que não agride. Isso foi importante pra gente fazer a escolha das bases das formulações, dos ativos, das fragrâncias, dos ingredientes funcionais que de fato estejam numa concentração adequada pra funcionalidade”, explica Silvana. Os produtos não têm corantes e a fragrância é baseada na peônia e na cereja negra, com diversas versões – o coração é o mesmo, o que muda é a base.
A Under Skin está se posicionando na faixa mais alta do mercado de dermocosméticos e os itens podem ser comparados com os da marca SkinCeuticals, da francesa L’Oréal e da NeoStrata, da espanhola Melora. Os produtos terão, em média, preços acima de R$ 100, e serão distribuídos em poucos pontos de venda do canal farma. “Não vamos ter promotoras nos PDVs, porque o nosso produto não precisa ser ‘empurrado’. Ele tem ciência, é comprovado. Nosso produto tem de ser sim testado pelo médico, e se passado por seu aval, aí sim deve ser prescrito e adquirido”, esclarece o empresário. Por enquanto, os pontos de venda exclusivos da marca são a Drogaria Iguatemi, de São Paulo e a Drogaria Venâncio, do Rio de Janeiro. A marca tem uma equipe de visitação médica com 15 especialistas.

A distribuição extremamente restrita, especialmente face ao investimento robusto, é um sinal de que o Grupo NC está ciente do tempo necessário para construir um negócio sólido no segmento de beleza. “O nosso horizonte é de longo prazo. É preciso tempo, dedicação, paciência e trabalho. Nossa estratégia é sempre estar focado na inovação e na ciência, trazer isso pra dermatologia”, argumenta o executivo.

Por enquanto, os produtos serão distribuídos apenas no mercado brasileiro, mas o projeto da marca contempla avanço para além das nossas fronteiras. “A Under Skin nasce como uma empresa com know-how e estrutura de multinacional. E esse é o nosso desejo: ser uma multinacional reversa. Desenvolver, através do nosso centro de pesquisa, produtos inovadores pra vender não só no Brasil, como também no mundo”, conta Leonardo. A marca tem planos de entrar nos Estados Unidos em 2016, e um pouco mais tarde na Europa. “A ideia é transformar a Under Skin numa empresa mundial, com foco nas Américas e Ásia”, conclui.

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